quarta-feira, 2 de março de 2011

GINETTA CALLIARI, UMA MULHER REALIZADA

GINETTA CALLIARI, UMA MULHER REALIZADA

Sandra Ferreira Ribeiro

Uma mulher com grandes ideais.
Ginetta Calliari nasceu em Trento, norte da Itália, em 15 de outubro de 1918. Amava as lindas montanhas de sua terra natal; era ávida de conhecimentos, gostava da arte, da filosofia, nutria uma grande sede pela justiça social...
Em 1944 Ginetta conheceu Chiara Lubich, e participou com ela e outras jovens de uma extraordinária experiência que desembocará mais tarde naquele que passou a se chamar Movimento dos Focolares.
Deparando-se com a precariedade de todos os seus ideais diante da destruição provocada pela Segunda Guerra Mundial, decidiram doar a própria vida a Deus vivendo os ensinamentos de Jesus conforme liam no Evangelho. Sentiam que a existência humana, com todas as suas alegrias e sofrimentos adquiriam um novo sentido, que plenificava a vida e, assim, queriam transmitir esse novo Ideal a todo mundo.
Em novembro de 1959, Ginetta desembarcou no porto de Recife. Com ela, vieram outras três focolarinas e quatro focolarinos, que iriam iniciar no Brasil os dois primeiros centros do Movimento para além das fronteiras européias.
Normalmente quando os missionários partem para terras longínquas, recebem um crucifixo como símbolo dos ideais que os motivam.
Ao se despedir do grupo de focolarinos que viajavam para o Brasil, Chiara disse a Ginetta que lhe dava não um crucifixo de metal mas um Crucifixo vivo. Isso significava que recebiam a incumbência de amar com amor de predileção todas aquelas pessoas que encontrariam no Brasil, especialmente aquelas que viviam sob qualquer espécie de sofrimento, recordando para eles o próprio Cristo na cruz.
De fato, Ginetta mesma conta: “Chegando a Recife foi um choque constatar a desigualdade social, a discriminação, a fome que transparecia nos rostos”. Era o encontro face a face com o Crucifixo vivo. “Disse, então, a mim mesma: “Aqui não dá para permanecer passivos. Alguma coisa precisa mudar. O que precisa mudar? O ser humano”. E concluiu: “É preciso pessoas novas, com uma mentalidade nova, pautada pela fraternidade, de modo que surjam estruturas novas e, de conseqüência, cidades novas, um povo novo!”
E foi o amor aos Crucifixos vivos que ela encontrou por onde passava, que orientou a vida e a ação de Ginetta e, com ela, a dos membros do Movimento, desde aquela época, inspirando inúmeras iniciativas de cunho social com o objetivo de contribuir na resolução da situação de miséria de muitas pessoas nas várias regiões do Brasil.
Após uma permanência de cinco anos no Nordeste, viajando por todas as capitais daquela região, e levando com a palavra e o seu testemunho o ideal da fraternidade e da unidade, Ginetta foi para a cidade de São Paulo. Em 1969, transferiu-se definitivamente para o município de Vargem Grande Paulista. Dali, durante cerca de trinta anos, acompanhou pessoalmente a fundação de outros centros de irradiação do Movimento dos Focolares no Brasil: em Brasília, Manaus, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Maceió, São Luís e, passo a passo, o desenvolvimento da Mariápolis Araceli (hoje Mariápolis Ginetta em sua homenagem), sede nacional dos Focolares.
A Mariápolis Ginetta, atualmente com cerca de 300 habitantes, é uma das 30 do Movimento. Surgiram com o objetivo de esboçar uma sociedade nova, expressão de fraternidade, de comunhão. Ginetta, com uma fé e trabalho incondicionais não economizou suas energias para que a Mariápolis se desenvolvesse e pudesse dar visibilidade aos ideais do Movimento dos Focolares. Ela era convicta de que a humanidade anseia por um mundo unido, por uma sociedade justa, e tinha pressa de demonstrar a todos que viver por esses ideais não é uma utopia mas é possível, é a única coisa que realiza realmente o ser humano, que sacia totalmente as suas mais profundas exigências de felicidade, de harmonia, de paz.
Por isso Ginetta tinha um coração largo, que abraçava o mundo todo e todo mundo, qualquer que fosse a convicção religiosa da pessoa. Buscava sempre o diálogo, seja com católicos e com cristãos de várias denominações, seja com fiéis de outras religiões e pessoas que, mesmo sem um referencial religioso, buscam a vivência de valores universais.
Ginetta acompanhou pessoalmente os trabalhos de formação humana em algumas localidades encontrando-se também periodicamente com os moradores como por exemplo – só para citar alguns - a Ilha do Inferno perto de Recife que em seguida passou a se chamar Ilha Sta Terezinha, na comunidade Magnificat no Maranhão, no Jardim Margarida, em Vargem Grande, no Butantã em São Paulo, no Bairro do Carmo, município de São Roque.
Na década de 1970 e 1980, quando fervilhavam na América Latina os movimentos sociais, tendo diante de si todas as pessoas dos Focolares que tiveram a própria vida transformada pelo Ideal da fraternidade e da unidade – inclusive várias provenientes de situações de extrema pobreza – Ginetta teve a idéia de organizar um livro que recolhesse todas essas experiências. O livro trazia como título “O Evangelho força dos pobres” (traduzido em italiano, holandês e espanhol) e adotado inclusive como livro-texto em algumas escolas. Foi um sucesso, e suscitou logo outro: “O Evangelho no dia–a-dia”, seguido de um terceiro, “Quando o Evangelho entra na família”.
Em 1991, Chiara Lubich, veio ao Brasil, e permaneceu vários dias na Mariápolis Araceli em Vargem Grande Paulista. Naquela ocasião, constatando pessoalmente as situações de injustiça social, lançou a idéia da “Economia de comunhão na Liberdade” (EdC).
A idéia da Economia de Comunhão (EdC) articula, em harmonia, princípios sociais e econômicos nunca antes justapostos: economia, solidariedade e liberdade. Visa a constituição de empresas – ou a inserção de outras já existentes - dispostas a colocar seus lucros em comum, destinando uma parte dos mesmos para os necessitados, outra para desenvolver estruturas para a formação de pessoas na cultura evangélica da partilha, e outra para incrementar a própria empresa.
Para Ginetta o projeto era uma resposta de Deus à sede de justiça que sempre a acompanhara, projetando em escala empresarial aquela comunhão de bens que desde os primórdios do Movimento era realizada em nível interpessoal. A participação de Ginetta na concretização da iniciativa foi imediata e determinante.
De modo especial, a implantação do Pólo Empresarial Spartaco, pioneiro na concretização da idéia de Chiara, requeria esforços, recursos, idéias e, especialmente, muita fé. O Brasil atravessava um período de recessão econômica; muitos estabelecimentos estavam fechando, e os membros do Movimento eram convidados a abrir empresas!
Com a sua típica fé em Deus, Ginetta ajudou moral e espiritualmente não só empresários, mas também funcionários e demais agentes da EdC não deixando que a chama inicial se apagasse no coração de ninguém. Ela olhava para frente, sabia que o projeto era uma inspiração de Deus; portanto, os obstáculos que apareciam pelo caminho seriam trampolins para passos ainda mais decididos: quantas experiências de leis que mudavam e de novas receitas financeiras, viabilizando o prosseguimento da iniciativa. Profissionais e até famílias inteiras, impulsionados pela fé que Ginetta tinha, mudavam-se de suas cidades e se transferiram para Vargem Grande para trabalharem pela EdC.
Em uma ocasião, respondendo a alguém que lhe tinha perguntado sobre o andamento da EdC, Ginetta exclamou “É sangue da alma!”, significando a sua profunda convicção da verdade contida na lógica do Evangelho: é da morte que nasce a vida, é morrendo na terra que o grão de trigo produz frutos! Essa certeza sempre acompanhou Ginetta em tudo o que fez e viveu.
Em 1996 nasceu o Movimento Político pela Unidade (MPpU), que vem se desenvolvendo também no Brasil. O MPPU constitui-se como uma rede mundial que congrega o empenho de pessoas de variadas tendências, que assumiram o ideal de transformar o princípio da fraternidade em categoria política, de modo que esta seja um instrumento para fazer da humanidade uma única família.
Em 1999, Ginetta acolheu na Mariápolis os parlamentares da Comissão Mista para o Combate e a Erradicação da Pobreza no Brasil. Eles visitaram a Mariápolis e o Pólo Spartaco pra conhecerem o projeto da EdC. Naquela ocasião, dirigindo-se a eles Ginetta afirmou: “Através dos senhores eu estou entrando no Congresso Nacional, e de lá não quero mais sair”. Expressava assim a sua convicção de que a política é aquele espaço privilegiado onde se tomam decisões que atingem todos os níveis da sociedade: economia, educação, cultura... E se aqueles ideais de fraternidade e de justiça que ela lhes havia apresentado não só com palavras mas com o testemunho de tantas pessoas, pudessem orientar continuamente os membros do Congresso Nacional, então um novo Brasil e a civilização do amor tornar-se-ia uma realidade.
Ginetta era profunda defensora da dignidade humana em todos os níveis. Para ela, a humanidade, obra prima de Deus, conforme a doutrina cristã, foi criada para ser a família dos filhos de Deus, na qual homens e mulheres têm uma idêntica responsabilidade na edificação da paz, da fraternidade. Por isso ela incentivava também as mulheres a tomarem iniciativas na sociedade: na política, na economia, nos cargos públicos. Sem essa específica contribuição feminina a vida em sociedade fica privada de equilíbrio, fica privada de tantos valores essenciais à formação humana – era a convicção também de João Paulo II. Na concretização da EdC muitas mulheres foram pioneiras justamente impulsionadas pela fé e coragem de Ginetta.
Ginetta faleceu em 8 de março de 2001. A data, em que se comemora o Dia Internacional da Mulher, assume assim um grande significado na biografia de Ginetta.
As últimas palavras dela, antes de morrer, foi a frase das Escrituras que, ao longo de sua vida, a ouvimos repetir em várias situações: “Sem derramamento de sangue não há redenção”. Sim essa foi Ginetta, uma mulher de garra, de grande fé, que possuía um grande Ideal e que sabia que por esse Ideal valia a pena dar a própria vida.
No seu funeral estavam presentes mais de duas mil pessoas, de todo o Brasil e do exterior; vieram tributar-lhe homenagem e gratidão por tudo aquilo que ela havia representado em suas vidas.
Após a sua morte muitos quiseram homenageá-la por reconhecerem quanto bem ela havia feito: foi realizada uma sessão solene na Câmara Federal dos Deputados, em Assembléias Legislativas de 11 Estados e em várias Câmaras Municipais. Além da cidadania honorária paulistana foi dado o seu nome a um viaduto na Castelo Branco na entrada de Osasco, a uma rua em Sorocaba, ao Pólo empresarial da Economia de Comunhão em Recife.
O seu túmulo, ao lado da Igreja de Jesus Eucaristia, na Mariápolis que hoje leva o seu nome, é meta de contínuas visitas. Diante dos inumeráveis e edificantes testemunhos sobre a vida de Ginetta, baseada na fé em Deus e voltada ao próximo e ao compromisso com a fraternidade e com a justiça social, aos 8 de março de 2007, D. Ercílio Turco, bispo de Osasco, decidiu dar início à sua Causa de Beatificação.

Um comentário:

  1. QUE GRANDE MULHER, COMO FAZ FALTA PESSOAS COMO ELA NA TERRA,, peço a ela no céu que Interceda por nós pecadores aqui na terra,amem,

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